quinta-feira, 13 de novembro de 2014

Manoel de Barros, uma homenagem

Texto em homenagem aos 90 anos do poeta, hoje falecido, poucos dias antes de completar seus 98 anos:



MANOEL DE BARROS: “O grande poeta de pequenas coisas”
por Tânia Du Bois
           
          Faço desta, uma homenagem, para dizer algumas palavras de encantamento ao poeta Manoel de Barros que aniversaria em dezembro. Peço licença para homenagear o grande mestre. Peço licença, sim, porque sou amante da poesia e, entre os meus escritores, Manoel de Barros é um dos preferidos e, em tudo o que se escrever sobre ele, estaremos nos repetindo, mas a repetição será permitida por sua grandeza pessoal e pela grandiosidade da sua obra. É um prazer poder reler, rever e reviver o poeta dos “desacontecimentos”, o “poeta do pantanal”, o “lírico da ecologia”, o “virtuoso do realismo mágico”, “o grande poeta de pequenas coisas”. O que me permite repassar alguns fatos significativos da sua vida, como diz Pedro Du Bois, “... Escrevo histórias / recontadas em outros dias / de mesmas palavras.” e Orides Fontela, “a luz está em nós: iluminamos.” – podemos dizer que a luz está em Manoel de Barros: iluminando-nos.
         A seguir, cito alguns textos sobre o poeta e sua obra.
         Fabrício Carpinejar, em “Manoel de Barros: poesia para reciclar”, dezembro de 2006, conta que o poeta está casado há 58 anos com Stella, seu grande amor. Ela é a primeira e única leitora de seus originais. É bem crítica. Se ela não gosta, diz: “Sobe e vai trabalhar mais”. Ele só dá por terminado o trabalho quando ela define que está bom, pois, conhece o seu estilo. Manoel de Barros editava as suas obras em tiragens artesanais e de escassa circulação. Teve o reconhecimento na década de 80, por críticos e personalidades, como o dicionarista Antônio Houaiss, o escritor Millôr Fernandes e o editor Ênio Silveira.
            Manoel é poeta do simples e da delicadeza, que adota a autenticidade dos defeitos. Tem estima pelas coisas e homens jogados fora pela sociedade. Seu universo é o do cisco, dos gravetos, dos inutensílios e dos nadifúndios. O escritor atua no espaço faz de conta. Interessa-se pelos hábitos das lagartixas, lesmas e animais rastejantes. O poeta faz brinquedos verbais com osso de arara, canzil de carretas, potes furados, sabugos. A singularidade de sua poética reside em combinar a aguda percepção urbana com um repertório primitivo e rural. Para Barros, o que é descartado é jogado dentro do poema. E afirma que o verdadeiro conhecimento está na leitura do mundo.  “Poesia é voar fora da asa” (O Livro das Ignoranças).
         O editor Ênio Silveira, sobre o “Livro das Ignoranças“, mostra como o poeta nos toca pela magia de seus versos, o que nos leva a compará-lo na tentativa de defini-lo como: “grande poeta de pequenas coisas”, “o lírico da ecologia”, “poeta do pantanal”, “o virtuoso do realismo mágico...”. Deixamo-nos envolver pela sua poesia, em que nos encantamos, pela sua constante redescoberta das palavras.
          Adélia Menegazzo, sobre a obra “Concerto a Céu Aberto”, aponta que a leitura de seus poemas vem preencher os vazios e descobrir que o poeta entrega ao leitor um concerto de sons... audíveis apenas no silêncio entre uns e outros. Porque, antes de tudo, MÚSICA! Cada verso seduz pelo desvio, pelas dissonâncias e revela a revolução das palavras, “Do canto das aves está posto o concerto em pauta”.
            Paulinho Assunção, sobre “Poemas Rupestres”, apresenta este menino que “pegou um olhar de pássaro” e que “contraiu visão fontana”, este menino, sábio dos “desacontecimentos”, este é um menino-manoel. É um menino “com olhar – furado – das nascentes”, que gosta de atrelar palavras de rebanhos diferentes, com o intuito de “causar distúrbios no idioma...”. É preciso dizer: todos nós nos desabrimos em outras pessoas diante da poesia de Manoel.
             Adalberto Müller Júnior, a respeito de “Matéria e Poesia”, traz que a originalidade do poeta consiste em elaborar liricamente, com as coisas menores, verdadeiras relíquias de linguagem. Manoel de Barros é capaz de transformar a matéria mais desimportante em poesia. E, Pedro Du Bois no livro “As Pessoas Nominadas”, presta homenagem ao poeta: Palavras // Um, santo de barro /outro, Manoel de Barros / de comum,/andor/ ardor/ com que santificam / palavras / ditas / escritas /jogadas ao vento / que as reproduz.”
            Não posso deixar de expressar minha gratidão pela existência de Manoel de Barros, pois ele é palpitação em nossas vidas. O seu conhecimento vem através dos sentidos. Ele descreve os sons, dando-nos condições de, ao lê-los, poder ao mesmo tempo ouvi-los e senti-los. O poeta humaniza as coisas, o tempo e o vento. E mais, gosta das músicas de Chico Buarque e de Paulinho da Viola!
            Ao completar 90 anos, recebeu o prêmio Nestlé de literatura, pelo livro “Poemas Rupestres”. Também conquistou outros dois prêmios: Jabuti e da Associação Paulista dos Críticos de Artes. Mas, o seu maior prêmio é ter a sua obra distribuída em todo o país.
            Manoel de Barros se considera um “songo”, como fez constar em seu poema inédito de mesmo nome: “Aquele homem falava com as árvores e com as águas /ao jeito que namorasse //... Dizia que era abençoado pelas rãs e pelos / pássaros / A gente acreditava por alto / Assistira certa vez um caracol vegetar-se /na pedra ////... Era muito encontrável isso naquele tempo./ Até pedra criava rabo!/ A natureza era inocente.”.          
         Discordo quando o poeta, em seu autorretrato falado, em 1994, disse: “estou na categoria de sofrer do moral, porque só faço coisas inúteis...”. Prefiro quando ele diz que a “Poesia tem que ter palavras, uma feira de ideias.”.

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